Mais dois momentos de saturação das redes sociais que testam um pouquinho demais o nosso caráter

dinesh

o elogio negativo: você tava até com uma certa vontade de assistir o filme. tinha visto o trailer, achado bacana, pinta de ser interessante. quando o primeiro amigo falou bem, você pensou aquele “ah, é bom mesmo então, né?” mas naquele sábado tava ocupado, não deu pra ver. na semana seguinte mais amigos elogiaram, cada vez com mais ênfase e você ficou “eita, mas deve ser top demais nesse caso”. mas os compromissos foram se emendando, o tempo foi escasseando, e os elogios tomaram também as redes sociais, cada vez com mais intensidade. “um filme que todo mundo devia ver”, “o melhor filme do ano”, “muito melhor que o filme x ou y”. você, que gostava do filme x ou y, que acha que o ano ainda tá muito no começo, começa a pensar que “ok, não tem como ser tão bom assim”. quando alguém diz que é um filme “obrigatório” e que “se você não gostar você não sabe o que é cinema”, você sente a sua curiosidade rapidamente se transformando num napolitano emocional com os sabores birra, antipatia e desconfiança, tudo servido numa taça com confeitos e até mesmo calda quente. quando começam a sair os textões no facebook, as resenhas emocionadas, as pessoas no twitter trocando o user delas pra nome de personagens do filme, você já está tão contra o filme que quando finalmente vai ao cinema pra assistir precisa comprar duas entradas, uma pra você e outra pra sua má vontade, que já assumiu um corpo sólido e ainda come quase toda a pipoca. você, claro, gosta do filme, era bom mesmo, mas nunca admite abertamente e evita discussões sobre o assunto por uns dois anos.

as fotos de férias: terça-feira. relatórios chovem na sua mesa como homens chovem do céu em canções setentistas mas você não tá na menor pilha de dizer “aleluia”. você entra no facebook pra relaxar por alguns segundos e sua amiga colocou uma foto de uma praia. bonita praia. você tá feliz pela amiga. a amiga continua colocando fotos. você continua feliz pela amiga. amiga não para de colocar fotos, você tenta não parar de ficar feliz pela amiga. lá pela décima foto você se vê brincando com conceitos mentais como “inveja branca” e pensando que você também tá precisando de umas férias, os dias no escritório cada vez mais longos, dá um sorriso cansado. quando a vigésima foto é postada online, um drink com guarda-chuvinha, você nota o eixo cromático da sua inveja se deslocando, de relance pela sua cabeça passa um “pra que tanta foto, né?”. pela trigésima-segunda foto a ideia de “tomara que engasgue com o guarda-chuvinha” surge por 3 segundos, como um flash, mas é rapidamente contida por áreas mais responsáveis do seu cérebro, que dizem que é o cansaço falando, essa pessoa não é você, não é o seu eu normal. quando o álbum atinge 122 fotos você está de punhos fechados, dentes levemente trincados, pesquisou se na praia que eles tão tinham águas vivas, arraias, leu que as queimaduras doem muito. ainda são três da tarde. uma foto sua nesse momento seria legendada com “começando os tabalhos” mas é porque o chefe botou mais coisa na sua mesa, o trabalho mal começou mesmo. tá foda hoje. sua amiga acaba de colocar mais 8 fotos.

6 Comentários

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6 Respostas para “Mais dois momentos de saturação das redes sociais que testam um pouquinho demais o nosso caráter

  1. A galera quase zuou tua experiência com Mad Max, né?

    • João Baldi Jr.

      rapaz, sim. o filme teve que ser muito bom pra eu conseguir gostar dele da maneira que ele merecia (mas a culpa claramente mais minha do que da galera)

  2. Nai Costa

    é sobre Mad max, certo? po, mas muito bom mesmo o filme. hahaha

  3. Eu ia ver, falaram muito, pensei… lançaram o jogo, já desisti de ver na mesma hora e sigo firme na decisão. Já não bastou Avatar

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